Como conectar a materialidade ESG ao negócio
No cenário atual, as empresas estão cada vez mais conscientes da importância de considerar fatores ambientais, sociais e de governança (ESG) em suas operações. Uma análise importante nesse processo é a da Materialidade ESG, que permite às organizações identificarem e priorizar questões relevantes para si e para seus stakeholders.
Em março, a Comissão S (Responsabilidade Social) discutiu o conceito de Materialidade, seu histórico desde os primeiros padrões até os desenvolvimentos mais recentes, sua aplicação no setor financeiro e evolução na União Europeia (UE). Seus membros acompanharam uma apresentação do Grupo Report, que possui mais de 20 anos em trabalhos relacionados à sustentabilidade, debateram a metodologia para elaboração de relatórios e estratégias de sustentabilidade a partir da análise de materialidade e algumas instituições financeiras associadas trouxeram casos de uso de aplicação deste indicador na estratégia, algo essencial para a sustentabilidade dos negócios atuais.
Grupo Report apresenta na reunião com os membros da Comissão a evolução da análise da Materialidade ESG por meio de normas, fatos e processos
O que é Materialidade e breve histórico
Materialidade, no contexto empresarial, refere-se à identificação e avaliação de questões ESG que têm potencial impacto nos resultados financeiros e na percepção dos stakeholders sobre a empresa.
A materialidade ESG tem suas raízes no pioneirismo da Accountability (AA1000), um conjunto de princípios e padrões desenvolvido na década de 1990 para a prestação de contas corporativa. Em seguida, a Global Reporting Initiative (GRI) desempenhou um papel fundamental ao introduzir diretrizes para relatórios de sustentabilidade, culminando no lançamento do GRI G3 em 2006, que incluiu a materialidade como um elemento-chave.
O conceito de materialidade continuou a evoluir com o tempo, culminando no movimento de consolidação liderado pela International Financial Reporting Standards (IFRS), culminando nos padrões ISSB (International Sustainability Standards Board) S1 e S2, recentemente lançados e já presentes na agenda regulatória da CVM. Esse movimento visa estabelecer padrões claros e consistentes para a divulgação de informações financeiras e não financeiras, incluindo temas ESG relevantes.
Aplicação da materialidade no setor financeiro e sua importância
No setor financeiro, a materialidade desempenha um papel significativo na avaliação de riscos e oportunidades associados a fatores ESG. Bancos, investidores e seguradoras estão cada vez mais incorporando considerações ESG em suas análises de crédito, tomada de decisões de investimento e gestão de portfólio. Isso ocorre porque questões como mudanças climáticas, governança corporativa e práticas laborais podem ter impactos significativos nos resultados financeiros das empresas.
Na apresentação, o Grupo Report destacou que o uso da materialidade não se limita apenas à conformidade regulatória ou à mitigação de riscos. As empresas também podem se beneficiar ao identificar oportunidades de negócios emergentes, melhorar a eficiência operacional e fortalecer relacionamentos com stakeholders por meio de uma abordagem proativa para questões ESG material. Segundo Tomás Carmona, consultor do Grupo Report, a empresa deve considerar a materialidade conectada ao fomento da estratégia do negócio e não apenas para uma simples escuta aos stakeholders.
Dupla materialidade e avanços na União Europeia
Um conceito recentemente destacado é o da "dupla materialidade", que reconhece que as empresas devem ser transparentes tanto em relação aos impactos que sofrem (sobre uma perspectiva de exposição a riscos) quanto aos impactos que causam (sobre uma perspectiva de externalidades) relacionados às temáticas ESG. Isso significa que as empresas devem considerar não apenas os riscos e oportunidades financeiros, mas também os impactos sociais e ambientais de suas operações e cadeias de suprimentos.
Grupo Report apresenta o conceito da dupla materialidade aos associados
Na União Europeia, o compromisso com a dupla materialidade é evidente no contexto do Corporate Sustainability Reporting Directive (CSRD), uma proposta legislativa que visa expandir os requisitos de divulgação não financeira para empresas de capital aberto e grandes empresas privadas. Essa iniciativa representa um avanço significativo na integração de considerações ESG na divulgação corporativa e reflete o crescente reconhecimento da importância da materialidade ESG para o desempenho empresarial sustentável.
Metodologia de report baseado em materialidade
Historicamente, as empresas têm atualizado suas metodologias de relatórios em função das novas demandas de frameworks e standards, buscando provocar uma evolução nos negócios. Segundo os representantes da Report, para a elaboração de relatórios baseados em materialidade se faz essencial seguir uma abordagem que seja adaptável às diferentes realidades dos negócios e que promova a transparência e a prestação de contas.
Uma metodologia eficaz de report baseado em materialidade geralmente envolve as seguintes etapas:
Um formato bastante usado, segundo a Report, é de representações gráficas, como os dos exemplos ilustrados abaixo.
Para o relatório, a materialidade sempre foi um princípio fundamental, adaptável às diferentes realidades dos negócios. Ao adotar uma abordagem baseada em materialidade, as empresas podem fortalecer sua posição competitiva, mitigar riscos, identificar oportunidades de negócios sustentáveis e promover a confiança dos stakeholders.
Casos de uso
Na reunião da Comissão S, houve destaque para alguns exemplos de aplicação da materialidade na estratégia do seu negócio apresentados pelo Banco Inter. Christiano Rohlfs Coelho, Head de Sustentabilidade da Inter & Co e Coordenador da Comissão S, explicou que a primeira escuta aos stakeholders para definir a Materialidade do banco foi realizada em 2019. Foi uma escuta digital, baseada em um benchmark de temas materiais para a indústria financeira nacional. Já em 2021, a organização evoluiu na metodologia e foram usados como pontos de análise:
Benchmark de Materialidade Setorial com MSCI e SASB (iniciativas ESG que avaliam e monitoram os riscos e oportunidades da Materialidade de diversas indústrias); Benchmark de temas materiais para as 10 maiores empresas do Brasil relacionadas ao modelo de negócio do Inter; consultas a 17 grupos de stakeholders; escuta a 16 áreas do Inter para priorização de stakeholders; captação de respostas por meio de questionário por e-mail, redes sociais e mensageria direta.
Ao final de 2023, foi iniciada a renovação da Materialidade Inter, na qual houve um aprimoramento exponencial na metodologia, já considerando riscos e oportunidades financeiras e socioambientais, por meio de entrevistas com stakeholders externos estratégicos, com a alta gestão (Conselho e Diretoria), assim como o desenvolvimento de workshops com executivos focados na dupla materialidade. Todo este trabalho ampliou a abrangência e profundidade da estratégia ESG da empresa para os próximos 2 anos, que será apresentada ao mercado em seu próximo Relatório Anual.
Christiano mostra os temas materiais definidos a partir da escuta realizada pelo banco em 2021
Um dos exemplos de projetos desenvolvidos a partir da escuta aos Stakeholders de 2021 foi o Orange Tech +, programa de capacitação em TI com foco nas metodologias Java back/front-end. Segundo Christiano, a definição da estratégia e o escopo do projeto de capacitação vieram da Materialidade Inter vigente na época. Foram selecionados os temas Inovação e Negócios, Inclusão Digital, Diversidade e Inclusão e Educação Financeira, sendo que foram priorizadas bolsas de estudo gratuitas para mulheres e pessoas negras. O projeto, que gerou mais de 35 mil bolsas de estudo, contou com workshops de educação financeira e teve mais de 24 mil vagas ocupadas pelos dois recortes de diversidade priorizados.
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